sábado, 8 de outubro de 2011

Contingências

Eu não queria que isso tivesse acontecido. Mas não pude evitar. Sei que sou culpado, que fui inconsequente e irresponsável. Mas não tinha a intenção. A primeira dose foi para me animar e desinibir, para eu ter coragem de me aproximar da menina que eu queria. Depois, foram muitas outras pra manter o clima de empolgação. Nem sei quantas. Lembro de quando era criança e ficava junto com meu pai enquanto ele bebia aperitivos. Ele parecia feliz nessas ocasiões. Já eram altas horas da madrugada quando resolvemos ir embora da festa. Pretendíamos esticar até um motel, e eu estava entusiasmado por isso. Tive um pouco de dificuldade para ligar o carro, mas consegui e dei a partida. Só que, pela euforia, acelerei demais, e pela alteração nos reflexos, me perdi numa curva batendo de encontro a um poste. Justo com o lado dela. Ela era tão jovem, tão linda.


O feito, feito está. E neste caso foi um feito bastante grave. Somente o tempo amenizará a tua dor, a tua culpa. Mas, pelo menos, tu te importas com o que houve, e isso demonstra tua sensibilidade e teu arrependimento. Sempre voltas neste tema para falar comigo, prova de que buscas tomar consciência. E mais uma série de medidas que adotastes desde que houve o acidente, são também indicativos do teu sofrimento e da tua luta por amadurecer e superar o trauma.


Inúmeros foram os transtornos a que Lúcio foi submetido após este evento infeliz. As questões legais, o processo, a habilitação apreendida, as questões de saúde, especialmente a saúde mental comprometida, horas a fio de análise para tentar se entender e se perdoar por ter cometido um ato tão cruel e ao mesmo tempo involuntário. Lúcio nunca mais dirigiu um automóvel. Vive um fiapo de vida. E sonha que aquela menina ainda existe. No sonho eles estão juntos, numa festa, e combinam de ir até um motel.

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